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Wilhelm Reich

 

 

Breve histórico de Wilhelm Reich
por Ana Luz Francés  
                                                                                                                                                                                                
 

 

 

 

"O amor, o trabalho e o conhecimento são as fontes de nossa vida. Deveriam também governá-la.”

Wilhelm Reich         

 

*Ao longo do texto as palavras e termos sublinhados indicarão links para acessar o Glossário com seus significados

 

 

Wilhelm Reich (1897-1957), neurologista, psiquiatra e psicanalista, pioneiro da revolução sexual, da psiquiatria social e da medicina psicossomática, foi o pai das psicoterapias corporais, um controvertido intelectual e um polêmico investigador. Atualmente muitos o consideram superado, enquanto outros ainda acreditam que ele foi o gênio mais revolucionário de nosso tempo.

 

Reich foi influenciado, em sua formação cultural, por duas grandes correntes de pensamento que coexistiam em Viena, Áustria: a Sociedade Vienense de Psicanálise e os dois partidos de inspiração marxista (Social-Democrata e Comunista).

 

Vários autores dividem, de forma didática, o desenvolvimento do pensamento reichiano em três grandes momentos:

• O período psicanalítico (1919-27);

• O período sociopolítico ou marxista (1927-38);

• O período orgonômico ou energético (1935-57)

 

Muitos acharam estranho que Reich tenha trabalhado simultaneamente em áreas tão diversas como a medicina, a psicologia, a sociologia, a fisiologia, a biologia e a física. Entretanto, apesar de tudo, seu objeto de trabalho permaneceu um todo funcional e lógico.

Há um fio condutor, o chamado “fio vermelho” que passa por todas as suas obras: o tema da função bioenergética da excitabilidade e da motilidade das substâncias vivas, ou seja, a função da sexualidade. O que une idealmente os três momentos da investigação reichiana é a visão de todos os fenômenos individuais, sociais e naturais como um processo energético.

A unidade fundamental do pensamento reichiano pode ser apreciada em sua obra A função do orgasmo, publicada em 1929, que indica a base da enfermidade mental e dos conflitos e tensões sociais como uma perturbação do desenvolvimento livre e sadio das funções biológicas básicas, precisamente a do orgasmo, relacionando o equilíbrio individual e social com o equilíbrio orgânico e celular no quadro de um processo energético

 

Reich explica que o problema da sexualidade, por sua própria natureza, penetra em todos os campos da investigação científica. O orgasmo, seu fenômeno central, é o núcleo de problemas que surgem no domínio da psicologia, da fisiologia, da biologia e da sociologia (Reich, 1974). Ele criou uma teoria científica da sexualidade, com métodos e descobrimentos experimentais, que chamou de economia sexual. A economia sexual, segundo Reich, visa “à investigação da energia biopsíquica” (Reich, 1974). A orgonoterapia é a técnica terapêutica da economia sexual. Alguns conceitos básicos, retirados do livro A Função do Orgasmo, podem definir sinteticamente esta teoria:

 

1. A saúde psíquica depende da potência orgástica;

 

2. A enfermidade mental é um resultado das perturbações da capacidade natural de amar;

 

3. A maioria dos seres humanos sofre de impotência orgástica, pois a energia biológica está bloqueada e se converte, assim, na fonte das mais diversas manifestações irracionais;

 

4. A cura dos transtornos psíquicos requer, em primeiro lugar, o restabelecimento da capacidade natural de amar. Isso depende tanto das condições sociais como das psíquicas;

 

5. As perturbações psíquicas são o resultado do caos sexual, originado pela natureza da sociedade;

 

6. A energia vital, em circunstâncias naturais, tem poder de auto-regulação;

 

7. A estrutura caracterológica do homem atual – que vem perpetuando uma cultura patriarcal e autoritária há quatro mil anos –caracteriza-se por um “encouraçamento contra a natureza dentro de si mesmo e contra o mundo social que o rodeia”. (Reich, 1974) Esse encouraçamento do caráter é a base da solidão, do desamparo, do insaciável desejo de autoridade, do medo da responsabilidade, da angústia mística, da miséria sexual, da rebelião impotente, assim como de uma resignação artificial e patológica. Os seres humanos têm adotado uma atitude hostil quanto ao que está vivo dentro de si mesmos, do qual têm se distanciado. Esse encouraçamento não possui uma origem biológica, e sim social e econômica;

 

8. A formação do caráter no âmbito autoritário tem como ponto central não o amor parental, mas a família autoritária. Seu instrumento principal é a supressão da sexualidade na criança e no adolescente;

 

9. O não cumprimento da lei natural da sexualidade (o homem é a única espécie que não a cumpre) é a causa imediata de uma série de desastres terríveis. “A negação social extrema da vida conduz às mortes em massa em forma de guerras, assim como as perturbações psíquicas e somáticas do funcionamento vital.” (Reich, 1974); Segundo Xavier Serrano Hortelano, Wilhelm Reich contribuiu para a criação e o desenvolvimento de um novo paradigma científico que questiona o saber científico atual e propõe uma nova forma de compreender a natureza, as leis da física e o próprio ser humano. Em termos do desenvolvimento da psicoterapia corporal, a concepção reichiana implica num modelo de saúde global que utiliza ferramentas multidisciplinares da medicina energética e da própria psicoterapia corporal para abordar a enfermidade, tanto do ponto de vista preventivo como do patológico, e onde os transtornos emocionais e afetivos são a chave para compreender grande parte dos distúrbios psicossomáticos.

 

Para Jorge Stolkiner, o valor básico do enfoque Reichiano está no fato de Reich ter sido o primeiro a percorrer a profundidade no ser humano com um enfoque completamente diferente de tudo o que havia até então. Segundo o autor, já a partir de Freud começa a haver uma mudança positiva quanto às perspectivas e possibilidades de crescimento humano. Entretanto, a psicanálise, ao mesmo tempo em que nos trouxe a profundidade da dimensão do inconsciente, possibilitando novas perspectivas de crescimento do indivíduo, também instituiu que esta dimensão tão profunda, inevitavelmente presente em nós, teria uma base anti-social e destrutiva, capaz de devastar tudo à sua volta caso se tornasse dominante. A plena possibilidade de liberdade do ser humano, desta forma, ficaria impedida, e as perspectivas de crescimento limitariam-se a um “reordenamento de controles”, sem configurar-se uma verdadeira mudança estrutural. Reich propõe uma mudança deste enfoque freudiano da natureza humana, ao afirmar que o centro de energia do nosso ser – nosso Core, nossa sexualidade, o traço de vida mais profundo em nós –, ou seja, o que verdadeiramente somos, é bom, é a natureza funcionando com perfeição, e não um demônio que devamos controlar a vida toda. Esta concepção torna mais amplas as reais possibilidades de plena liberdade em cada ser humano, tornando possível a criação de uma ponte entre maturidade pessoal e sexual e a manifestação livre de uma vida plena, funcional e harmônica.

 

 

Quem foi Wilhelm Reich e qual foi a sua obra?

Dados Biográficos de Wilhelm Reich (1897 – 1957)

 

 

Wilhelm Reich nasceu em 24 de março de 1897, na parte germano-ucraniana da Áustria, filho de um abastado agricultor. Permaneceu cidadão austríaco até 1938; seus pais eram de origem judaica. A sua língua-mãe foi o alemão.

Logo após seu nascimento, a família se mudou para uma fazenda em Jujinetz, próximo a Chernivtsi, Bukovina, onde o pai de Reich passou a gerenciar uma fazenda pertencente à família de sua mãe. Reich atribuiu muito de seu posterior interesse no estudo da sexualidade e das bases biológicas das emoções à sua criação na fazenda, onde, como ele próprio colocava, as “funções naturais da vida” nunca lhe foram omitidas.

 

De 1903 a 1907, é instruído por um professor particular austro-germânico e submete-se regularmente a todos os exames em uma escola pública austro-germânica. A partir de 1907, Reich passa a freqüentar uma escola alemã.

Após a morte de seu pai, em 1914, Reich toma as rédeas da fazenda da família e continua com seus estudos, formando-se com notas excelentes no ano de 1915. No verão deste ano, os russos invadem Bukovina, em batalhas da 1ª Guerra Mundial, e Reich refugia-se em Viena com seu irmão mais novo, perdendo todas as suas posses.

 

De 1916 até o final da Primeira Guerra Mundial, em 1918, presta serviço militar como sub-tenente no Exército austríaco, tendo sido enviado três vezes para o front italiano.

 

Em 1918, com o fim da guerra, Reich vai cursar medicina na Universidade de Viena. Lá, tem seus primeiros contatos com o trabalho de Sigmund Freud; os dois se conhecem em 1919, quando Reich vai ao encontro de Freud procurando material didático para o Seminário de Sexologia que então organizara para os estudantes de medicina, e do qual, posteriormente, tornou-se diretor, preenchendo uma lacuna que havia aflorado durante sua preparação profissional. Menos de um ano depois Freud convida Reich para atender pacientes como psicanalista. Em outubro de 1920, Reich torna-se, aos 23 anos, membro da Sociedade Psicanalítica Vienense – naquela época dirigida pelo professor Sigmund Freud –, após dar contribuições clínicas e teóricas à Sociedade.

 

Em 1921, casa-se com Annie Pink – estudante de medicina que também se tornou psicanalista –, com quem permanece até 1932, e tem duas filhas: Eva, nascida em 1924, e Lore, nascida em 1928.

 

Em 1922, tendo conseguido o seu diploma de licenciado em medicina, Reich continua seus estudos na Universidade de Viena. Estuda neuropsiquiatria junto à Clínica Universitária de Neurologia e Psiquiatria, dirigida pelo professor Wagner-Jauregg. Como, ainda antes de obter seu diploma de licenciado, Reich já havia iniciado a prática de psicanalista clínico, combina esta prática sucessivamente com a atividade psiquiátrica. Quando a Clínica Psicanalítica do professor Freud, em Viena, inicia suas atividades, no ano de 1922, Reich torna-se seu assistente clínico, papel que cumpre até 1928, quando passa a diretor do Instituto. De 1924 a 1930, dirige o Seminário Para a Terapia Psicanalítica na mesma clínica, e torna-se também membro da equipe de professores junto ao Instituto Psicanalítico de Viena, onde desenvolve seminários, realiza pesquisas sobre as causas sociais da neurose e ministra conferências sobre temas de caráter clínico e sobre as teorias biopsiquiátricas. Entre os seus alunos daquele período, há um discreto número de psiquiatras americanos que, posteriormente, tornam-se professores de psiquiatria e diretores de clínicas psiquiátricas na América. Com Reich, estudam a prática da Psicanálise e a análise caracterológica.

 

Baseado nesses estudos, o livro de Reich Análise do Caráter, traz uma revolução na prática da psicanálise clássica, que tem suas bases no foco do tratamento de sintomas neuróticos. Análise do Caráter propicia um grande salto dentro da psicologia. Na visão de Reich, todo o caráter (ou personalidade) de uma pessoa – e não apenas os sintomas individuais aparentes – deveria ser olhado e tratado como fenômeno neurótico. O livro também introduz a teoria de Reich sobre a couraça caracterológica: afirma que a energia sexual retida no corpo produz estrangulamentos energéticos em músculos, tecidos e vísceras, impossibilitando a fluência e a descarga de energia.

 

Em 1924, enquanto desenvolve a própria profissão junto à Policlínica Psicanalítica de Viena, Reich inicia suas pesquisas sobre a etiologia social das neuroses, dando continuidade a elas nos centros de consulta para a higiene mental que fundou em diversos bairros de Viena, de 1928 a 1930. No ano de 1930, transfere-se para Berlim, onde continua o mesmo trabalho, ensinando e dando conferências, tanto no Instituto Psicanalítico quanto na Universidade Popular. Essa atividade o transforma no médico-guia dos centros de higiene e consulta sexual de várias organizações culturais, liberais e socialistas, tanto em Berlim como em outras cidades alemãs.

Reich argumentava que a base da repressão sexual está dentro da moralidade burguesa e das estruturas sócio-econômicas que a produziam. Como a repressão sexual é a principal causa das neuroses, a melhor solução seria ter uma vida sexual ativa e livre de culpa e julgamentos. Ele afirmava que tal liberação só poderia acontecer por meio de uma moralidade não imposta por uma estrutura econômica repressiva.

 

Em 1930, ao mudar-se de Viena para Berlim e unir-se ao Partido Comunista Alemão, começa para Reich uma série de anos inseguros, que teriam bloqueado ou, ao menos, dificultado a atividade de qualquer homem menos vital do que ele. Seus escritos sobre as bases psicológicas do fascismo – caracterizando-o como um sintoma da repressão sexual – o tornam, tanto na visão dos comunistas como na dos nazistas, um homem perigoso.

 

Em 1931, Reich funda a Sexpol (Associação Para Uma Política Sexual Proletária), que chega a contar com 40 mil membros, e a Sexpol-Verlag, uma editora independente com a função de publicar obras escritas fora de qualquer pressão ou censura. Seu objetivo era unir as descobertas iniciais de Freud a uma prática revolucionária que pudesse ser útil na luta do proletariado pela sua emancipação econômica, política e sexual. Mas o movimento assume proporções que incomodam o poderio vigente, representado à época pelo Partido Comunista. De fato, incomodam não só ao Partido Comunista: depois que Hitler assume o poder, todas as publicações de Reich sobre o assunto são recolhidas das bibliotecas e livrarias, e sua venda é proibida.

Em 1932, Reich conhece Elsa Lindenberg. No ano seguinte, separa-se de Annie Pink, que fica com suas filhas, para casar-se com Elsa, com quem vive até o ano de 1939. Em 1933, devido aos problemas políticos, consegue fugir para a Dinamarca, onde continua a desenvolver um ensinamento ativo e um training psicanalítico. Não lhe é possível, entretanto, permanecer por muito tempo na Dinamarca, provavelmente por causa das pressões da Alemanha nazista sobre as autoridades dinamarquesas. Toma conhecimento de que foi expulso do Partido Comunista Alemão por causa de suas críticas à atuação do partido diante da irrupção do nazismo.

 

Em 1934, transfere-se para Malmõ, na Suécia, onde permanece aproximadamente seis meses. Em agosto deste ano, assiste ao XIII Congresso da Associação de Psicanálise, celebrado em Lucerna – no qual apresenta uma comunicação sobre “Contato psíquico e corrente vegetativa” –, onde lhe comunicam que foi expulso das associações alemã e da internacional. Convidado pelo professor Harald Schielderup, diretor do Instituto de Psicologia da Universidade de Oslo, vai para a Noruega, onde permanece de novembro de 1934 até agosto de 1939, com uma permissão temporária de curto prazo. Em Oslo, paralelamente ao ensino psicoterapêutico e à preparação dos alunos, Reich inicia um trabalho experimental de laboratório em fisiologia, biologia e biofísica. Foi durante esses anos de grandes ansiedades que Reich realizou suas mais importantes descobertas.

 

Em 1939, recebe um convite da New School For Social Research, de Nova Iorque, para dar conferências sobre psicologia médica, como professor adjunto. Transfere seu laboratório para os Estados Unidos e se estabelece em Forest Hills, no Estado de Nova Iorque, onde conhece sua terceira mulher, Ilse Ollendorf, com quem vive até 1954 e tem um filho, Peter.

A princípio, Reich aluga uma casa nesta localidade, mas anos depois, já em melhores condições, compra uma, onde implanta um escritório, um laboratório e sua residência particular. Passa os verões no estado do Maine, no Condado de Franklin, próximo ao lago Mooselukmeguntic, e nessa região, em 1942, compra cerca de 280 acres de terra, onde pretende organizar o futuro centro para o estudo da orgonomia, ciência do orgone ou da energia vital, que havia descoberto. Dá a esta propriedade o nome de Orgonon. Em Orgonon, aos poucos, Reich cria um laboratório para os alunos, alguns locais para trabalhar e residir, e finalmente um observatório, equipado com laboratório e alojamentos residenciais.

 

Em 1950, transfere quase toda sua atividade para Orgonon, onde, a partir de então, passa o ano todo, com exceção de algumas viagens ocasionais (a maior parte delas para Nova Iorque). Orgonon foi a residência de Reich até a sua morte.

Em 1954, a FDA (Food and Drug Administration) dos Estados Unidos começa, a partir de uma publicação difamatória, uma investigação acerca de Reich, e ele é acusado de venda de objetos terapêuticos ineficazes, num processo de evidente motivação política e que pode considerar-se inserido na “caça às bruxas”, ocorrida no período chamado de “macartismo”, onde eram perseguidas as pessoas cujas atividades eram consideradas “anti-americanas”. Reich não se apresenta no julgamento e é condenado por desacato à corte. Em 11 de março de 1957, é preso na penitenciária federal de Lewisburg, na Pensilvânia. Mesmo preso, prestes a viver seus últimos momentos de vida, quando da visita de sua última mulher, Aurora Karrer – a quem uniu-se em 1954 –, Reich lhe afirma que, ainda que com medo de ser morto, sentia-se forte e tinha planos de continuar seus trabalhos. Ele morre em 3 de novembro do mesmo ano, sob circunstâncias dramáticas.

 

Principais descobertas no desenvolvimento científico de ReichReich manteve o foco de seu trabalho na estrutura do caráter, mais do que em sintomas neuróticos individuais. Ele estava, de muitas maneiras, à frente de seu tempo, fosse na promoção de uma sexualidade saudável na adolescência, fosse na discussão sobre métodos contraceptivos e aborto ou sobre a importância da independência financeira feminina. O biógrafo Myron Sharaf escreve que o trabalho de Reich deixou uma profunda marca em importantes pensadores, como Alexander Lowen, Fritz Perls, Paul Goodman, Saul Bellow, Norman Mailer, e William Burroughs.

 

São algumas das suas descobertas principais: a teoria do orgasmo e a técnica da análise do caráter (1923-34); o bloqueio respiratório e a couraça muscular (1928-34); economia sexual e auto-regulação das pulsões naturais primárias e sua distinção das pulsões secundárias e pervertidas (1928-34); o papel do irracionalismo e da economia sexual humana na origem da ditadura de todas as denominações políticas (1930-34); o reflexo do orgasmo (1934); a natureza bioelétrica da sexualidade e da ansiedade (1935-36); as vesículas de energia orgone, os bíons (1936-39); a origem da célula do câncer a partir do tecido animal desintegrado bionoticamente e a organização do protozoário a partir do musgo e da grama desintegrados bionoticamente; os bacilos-T no sarcoma (1937); a descoberta da bioenergia (energia orgone) nos bíons Sapa (1939), na atmosfera (1940); invenção do acumulador de energia orgone (1940); e do medidor do campo de energia orgone (1944); terapia experimental orgone na biopatia do câncer (1940-45); invenção experimental da biogênese primária (experimento XX, 1945); método do funcionalismo orgonômico (1954); equações orgonométricas (1949-50); hipótese da superposição cósmica de dois feixes de energia orgone na base da formação de furacões e galáxias (1951); os efeitos da radiação antinuclear da energia orgone (experiência Oranur, primeiro relato, 1947-51).

 

Enfoque terapêutico reichianoNos seres vivos, inclusive no homem, existe um metabolismo energético (carga e descarga de energia que tomamos do ambiente através da respiração, da alimentação e através da pele), um fluxo energético (entrada e saída de energia de cima para baixo) e uma pulsação energética(expansão e contração de todo o corpo, órgãos e células, do centro à periferia e vice-versa).

 

Devido ao desconhecimento da função da sexualidade em geral e do orgasmo em particular, que é a de regulador da energia biopsíquica do organismo, esta função está perturbada na maioria dos seres humanos. Este processo é mantido pela repressão sexual de origem social. A energia represada é a fonte de inúmeros sintomas individuais e sociais. A orgonoterapia, técnica desenvolvida por Reich para estabelecer o equilíbrio emocional e físico dos indivíduos, é uma terapia energética. A energia alimenta tanto a psique quanto o soma. Portanto, na base de qualquer sintoma, seja ele psíquico ou somático, há um desequilíbrio energético que precede à formação do sintoma.

 

Para Reich, a neurose é o somatório de todas as inibições do prazer e da expansão, que ocorrem, num processo dinâmico com o meio, desde o início da vida, e com o transcorrer do tempo se transformam em crônicas. Estas inibições se cristalizam em defesas caracterológicas e musculares através de um desequilíbrio no funcionamento do nosso sistema nervoso autônomo, que é a parte do sistema nervoso que rege e regula nossa vida relacional. As couraças de caráter e muscular se formam na infância, na interação com o ambiente, para lidar com sensações energéticas que, de outro modo, produziriam angústia. Reich descobriu que a tensão muscular forma sete anéis ou segmentos ao longo do corpo, compostos por grupos funcionais de músculos transversais ao fluxo de energia, desequilibrando assim o metabolismo, a circulação e a pulsação energéticas.

 

 

A proposta da orgonoterapia é atuar por meio de técnicas específicas, permitindo que a energia fixada nas couraças possa ser liberada das tensões musculares e da rigidez do caráter, restabelecendo no indivíduo a saúde física e a capacidade de criar, amar e ser feliz. Assim, a orgonoterapia utiliza-se de técnicas relacionais, verbais e corporais para desbloquear a energia estagnada que produz os sintomas psíquicos e somáticos. Quando a energia circula no organismo, as emoções que antes estavam reprimidas, ou inconscientes, vêm à tona com a correspondente lembrança da situação que provocou o bloqueio. O orgonoterapeuta trabalha com questões que vão para além do enfoque psíquico, abrangendo, de forma holística, tudo o que diz respeito ao funcionamento energético do indivíduo e seu meio.

 

Algumas Considerações Finais

 

  • Quando se fala de sexualidade na teoria reichiana, não se está falando simplesmente de seus aspectos mecânicos ou físicos, mas sim da profundidade emocional que a experiência sexual pode alcançar. Para Reich, a energia sexual é a energia da vida, e a fórmula do orgasmo é a do funcionamento do vivo, como demonstrou e documentou nos diversos experimentos que realizou.

 

  • A orgonoterapia é uma terapia de crescimento, que visa ao desenvolvimento das potencialidades individuais, isto é, ao estabelecimento da nossa maturidade genital no mundo. A genitalidade é a nossa função de criação, e vai se manifestar no mundo principalmente como a capacidade do sujeito de amar e de realizar um trabalho vitalmente produtivo e prazeroso. É uma terapia orientada para o crescimento, a liberdade e o amor.

 

  • Reich tinha uma visão otimista do homem, porém pensava que socialmente nada mudaria até que se prevenisse a doença emocional. Então, nos últimos anos de sua vida, fundou, junto a 40 profissionais da orgonomia, o OIRC (Orgonomic Infant Research Center, ou Centro de Pesquisas Orgonômicas da Infância), um centro para a pesquisa a respeito da criança saudável. Cuidando e supervisionando a gestação, o parto, a amamentação e a educação, respeitando o princípio de auto-regulação energética em cada fase do desenvolvimento psicossexual, pretendia estudar o que fosse a saúde e prevenir a formação de couraças patológicas crônicas na infância. Vários pesquisadores em todo o mundo continuam suas pesquisas e alguns resultados estão sendo publicados.

 

  • Reich foi um grande pensador: uniu o pensamento científico ao sociocultural, além de explorar a natureza essencial do ser humano. Sua obra impressiona por sua amplitude e profundidade. Suas teses têm importância crucial para o momento atual, uma vez que o homem, ao ter se distanciado das funções naturais dentro de si mesmo, se distanciou também da natureza que o rodeia, colocando assim em risco a si mesmo e ao planeta.

 

  • Ele chegou à conclusão de que é o deserto emocional do homem que cria o deserto na natureza, referindo-se à enorme capacidade que o ser humano tem de destruir a vida sem hesitar. Reich entendeu que na raiz deste “deserto emocional” generalizado está o mal que fazemos, inconscientemente, aos recém-nascidos, com intervencionismos desnecessários e desconsiderando sua extrema sensibilidade emocional, tornando muito prejudicado o desenvolvimento da sua capacidade de amar. Acreditava que a grande esperança em relação ao futuro da humanidade era a prevenção da doença emocional nas crianças ainda por nascer, às quais chamou de “crianças do futuro”. Segundo afirma em O Assassinato de Cristo, “a criança recém-nascida passa a ocupar, naturalmente, o centro da medicina preventiva e da educação. Desta maneira, o princípio comum da humanidade é obtido, não como um ideal pelo qual se esforçar, não como um programa político, mas como o foco da raiz mais profunda da humanidade, como alicerce, para se construir sobre ele...” (Wilhelm Reich, 1951).

 

 

Referências bibliográficas:

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O éter, Deus e O Diabo / A superposição cósmica, São Paulo: Martins Fontes, 2003.

 Psicologia de massas do fascismo. São Paulo: Martins Fontes, 1988.

SERRANO HORTELANO, Xavier. Contato, vínculo, separação: sexualidade e autonomia egóica. São Paulo: Summus Editorial, 1994.

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